Talvez pela última vez outra vez, o aquático membro do Pink Floyd Roger Waters nadou nas nascentes que deságuam nas enchentes da Avenida Silva Lobo no Curral Del Rei, procurando a tal batida perfeita – que ele teria encontrado, tivesse ele surfado no Anel Rodoviário.
Ou fez um show no Mineirão. Ainda assim, talvez pela última vez. Outra vez.
A turnê This is Not a Drill traz o Roger mais à vontade para escancarar sua política, o que é bem-vindo pra cacilda. Quem me dera ele estivesse assim já na turnê de 2018, que teve já uma intensificação mas ainda pareceu light.
Engraçado, eu achava que eu tinha tudo pra ser um farofeiro quando eu ficasse um velho sórdido e covarde. Agora que eu formei minha pupa de quase-meia-idade para chegar em minha forma final, me sinto muito mais interessado quando as coisas são repaginadas na minha frente. Por bem ou por mal.
Eu até consegui ficar relativamente livre de spoilers da setlist. Então foi supimpa depois do anúncio ao início mandar os fãs de Floyd que não gostam da politicagem do Roger ir pro bar – com toda a gentileza, o show começar com a versão sepulcral, pós-apocalíptica de Comfortably Numb 2022, uma elegia para o mundo. Que telões, viu.
Eu prefiro o cenário em forma de cruz usado nos shows mais intimistas, mas Brasil é país de show de estádio, fazer o quê. Deu pra fazer algo interessante ainda assim – mas pra mim ficou claro que estavam improvisando ainda algumas montagens.
Vamos de Bom, Ruim e Feio? Vamos.
O Bom
Uma das melhores coisas que aconteceram na carreira do Roger foi o envelhecimento dele. Ele passou de estagiário do Coringa pra irmão do Richard Gere, e de uma ovelha asmática para um senhor que viu algumas coisas e não voltou de lá.
Wish You Were Here foi cantada uma oitava abaixo, e encaixa muito melhor pra ele, num take mais intimista, enquanto conta uma história com o Syd. …E enquanto cuidadosamente evita o Gilmar.
Have a Cigar cai dois tons também, se rendendo à supremacia do Dó Menor.
Pegou uma coisa do Radio KAOS aqui, uma do Final Cut acolá, e uma do Amused To Death. The Bar como material novo, com reprise recontextualizada. Me likey.
A mensagem política nunca esteve tão escancarada no primeiro plano (não que The Wall por exemplo não estivesse, mas é mais apegada à narrativa), e que alívio deve ser ficar menos e menos inibido. Ele tem alvos mais definidos que no Us+Them.
O Ruim
O palco. A versão para megashow de estádio brasileiro está bem aquém tanto do palco em cruz das etapas mais abençoadas da turnê, quanto até mesmo do palco do Us+Them de 2018, que claramente teve mais cuidado e foi pensado para a ocasião.
As imagens em si até funcionaram, mas o impacto poderia ser melhor. Muita coisa pareceu improvisada e de última hora, e eu não ficaria surpreso se realmente fossem. Uma pena para um array de telões tão estupidamente bem definidos.
Nessa nota, não terem negociado pra trazer o palco (e nessa quebrar um pouco a ideia da pista premium) foi um ponto bem baixo. Poxa, Rogério.
O Feio
Pra variar… as pessoas, né. Fumantes reclamando de gente que invade pontos-chave de área de arquibancada pra ficar em pé. Os dois grupos poderiam fazer o favor de não serem ruins para as outras pessoas, mas é difícil demais.
O tropeiro do Mineirão dá até vontade de comer já que só se entra nesse lugar de 5 em 5 anos, mas nossa como é indigesto.
E eu estou esperando a mesma coragem de não tocar Time para não tocar Another Brick in the Wall pt.2! Toca a parte 1, PULA A PARTE 2, toca a parte 3, Rogério! Coragem!
Vc poderia colocar essa Review em uma revista! Vc é um escritor nato e precisa reconhecer seu talento! Te amo! ❤️